EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA OS NOVOS TEMPOS

No sábado, 1 de agosto, eu conversei com a Profa. Dra. Juliana Maria de Oliveira em uma live no perfil da gonabee no instagram. A Profa. Juliana é engenheira agrônoma, mestre em entomologia e o doutora em engenharia agrícola pela Universidade Federal de Viçosa. Ela é natural de Rio Casca (Minas Gerais) e atualmente ela leciona na faculdade Unicerp, além de realizar auditorias e gerenciar um perfil de Educação ambiental no Instagram, o Muda Mundo Educação Ambiental. O Muda Mundo e outros assuntos relacionados à educação ambiental foram temas da nossa conversa. Leia o que rolou de mais importante neste artigo:

Por: Diego A. Gonzaga | Publicado em 13 de agosto de 2020

Da agronomia para a agroecologia: Como foi a sua transição?

Essa é uma situação realmente muito delicada, porque apesar de amar a agronomia, eu comecei a ver a produção agrícola com outros olhos, para além do extrativismo. Eu comecei a observar a situação da produção de alimentos e agropecuária de uma forma mais sustentável Quando eu estava na graduação, tive a feliz oportunidade de conhecer e trabalhar com pessoas que desenvolviam projetos na área de controle biológico. Então fiz estágio em um projeto de controle biológico, criação de insetos e parasitóides por dois anos e meio, no Bioagro/UFV e então tive a oportunidade de cursar o mestrado nesta mesma área sob orientação da Dra. Madelaine, da EPAMIG/Viçosa. Com isso, cresceu ainda mais a gana de fazer uma agricultura diferenciada, não apenas indo a campo mas também abordando o tema sustentabilidade, da melhor maneira possível, no ramo da educação, como docente. Assim, eu tento transmitir essa filosofia para os meus alunos e instigá-los a pensar: até que ponto nós vamos produzir dessa forma linear e extrativista. Como eu já tenho anos com esse trabalho naturalmente fluiu para esse caminho, não teve muito esforço, não.

Muitas pessoas ainda insistem em desacreditar o problema ambiental pelo qual estamos passando. No seu dia a dia, como você exemplifica as mudanças climáticas? Quais as mudanças mais palpáveis que podemos observar hoje no Brasil?

Na realidade, a educação ambiental não envolve apenas as mudanças climáticas. Este é apenas um tópico dentre os vários pontos de abordagem desta área tão abrangente que é a Educação ambiental. Mas respondendo à sua pergunta de forma mais objetiva, uma situação mais palpável e muito clara na diferenciação é o exemplo da chuvas. Pergunte para os seus avós, para os pais, como que era a distribuição de chuvas no decorrer do ano, ou mesmo mais recentemente, de 10 anos anos para cá. Antigamente ocorriam chuvas em pequenas quantidades e de forma bem distribuída. Hoje em dia as chuvas são muito intensas e separadas. Chove muito de uma só vez e a diferenciação de períodos de chuva é extremamente pronunciada. Por isso, ocorrem os alagamentos, os inúmeros desastres que as pessoas atribuem a vários fatores, mas não aceitam que são de responsabilidade delas próprias. As pessoas não têm consciência de que asfaltar ruas, muitas vezes de forma não planejada e que a falta de escoamento adequado da água das chuvas, pode gera grandes volumes de água passando por determinado local e provocando grandes estragos. Essa é uma situação crítica nas nossas cidades atualmente. Outra questão que eu costumo falar é a dos rios aéreos, que tanto se fala atualmente devido ao desmatamento na região amazônica. Essa diferenciação de quantidade de chuva também está relacionado com desmatamento da amazônia e muitas pessoas não sabem, pois não entende o processo hidrológico por trás do regime de chuvas e como as coisas estão conectadas. Então não adianta pensar em um ponto apenas, ou em apenas na mudança climática. Existe todo um sistema que está sendo alterado pela ação do homem.

Dentro deste sistema, que tem sofrido desequilíbrio com a ação do homem, os seres interagem e formam relações que os conectam, seja direta ou indiretamente. A pressão ambiental causa efeitos colaterais que muitas vezes nos pegam de surpresa e não sabemos lidar com elas em um primeiro momento. A pandemia de COVID-19 tem relação com o desequilíbrio ambiental que as ações do ser humano estão causando?

Existem milhares de micro-organismos bactérias fungos vírus e etc… no meio ambiente, e eles estão aí no meio da natureza. Porém, quando eles interagem com os organismos corretos não causa dano nenhum, algo muito semelhante ao que ocorre conosco. Nós temos dezenas de bactérias dentro do nosso intestino que em sincronia não oferecem perigo a nossa saúde, quando funcionando em equilíbrio. Porém, a partir do momento em que há um desequilíbrio, algum tipo de microrganismo pode se sobressair em relação a outros e causar doenças. O mesmo pode ocorrer na natureza, os animais possuem alguns vírus, algumas bactérias, que fazem parte do seu organismo. Entre eles, a transmissão mútua não é um problema. Mas a partir do momento em que retiramos esses animais selvagens do seu habitat cria-se a possibilidade de haver contato com o ser humano e a chance de incidência de doenças aumenta. Já existem vários estudos, inclusive deste ano, relacionados a essa questão. E tudo isso justamente pela falta de consciência das pessoas de que precisamos respeitar o habitat de cada animal. No decorrer do tempo, se nós não respeitamos esse limite a chance de acontecer uma outra pandemia, uma nova disseminação de doenças é muito grande. Isso porque, a princípio, não se sabe de que doença se trata, não se sabe como lidar, não existe vacina, não existe soro, é um micro-organismo novo e por ser novo demanda um tempo para ser estudo e conseguir desenvolver soluções. Nesse período a doença circula de forma descontrolada. Então, se as pessoas entendessem que é necessário respeitar o espaço do outro seja animal seja o ser humano essa chance de pandemia poderia ser evitada. Mas infelizmente a tendência é aumentar…

Porquê decidimos fechar os olhos para uma questão tão urgente como questão ambiental?

Na minha opinião é uma irresponsabilidade! Façamos uma metáfora com o gerenciamento financeiro para facilitar o entendimento: Digamos que que duas pessoas tem R$1000 cada, e elas tem que administrar esses mil reais. Porém, uma delas gastou os R$1000 dela de forma inconsequente ficando com apenas R$50, enquanto a segunda pessoa fez um bom gerenciamento, investiu bem e chegou a R$3.000. O que eu vejo hoje, infelizmente, é que algumas pessoas pensam assim: “nossa, esses americanos aí destruíram tudo o que eles tinham e agora vem dar pitaco no Brasil”, “os europeus destruíram tudo e agora querem dar pitaco aqui…”. Eles são errados? Não. Assim como na metáfora do dinheiro, essas regiões, estão quase esgotando seus recursos naturais. Porém, seria muita irresponsabilidade de nós brasileiros, que ainda temos uma “poupança” de recursos naturais, agirmos de forma inconsequente. Em relação às questões ambientais, o fato de termos “reservas” não nos dá o direito de utilizar de forma não sustentável. O mercado tem grande influência sobre a forma como nós fazemos uso dos recursos. Existem várias iniciativas de incentivo para os produtores que desenvolvem uma forma sustentável de produção. Uma saca de café que recebe um selo, seja porque o café é produzido de forma socialmente justa ou ambientalmente correto, é bem remunerado por isso. Não é só “pitaco de gringo”, é retorno financeiro. Além da nossa própria auto-responsabilidade existem questões financeiras relacionadas a produção sustentável. Não existe em outras regiões a riqueza ambiental como a presente no Brasil. Os investidores sabem disso e têm interesse em nos incentivar a continuar mantendo o manejo mais sustentável.

Como você disse “para abordar o tema sustentabilidade, a melhor maneira possível, é pela educação”. Qual o papel da educação ambiental na mudança de comportamento das pessoas em relação às mudanças climáticas?

A educação ambiental é mais um pilar da Educação, de forma mais generalista. Essa educação, mais geral, por si só já faria toda a diferença. Pequenas coisas, como o ato de não jogar lixo na rua, de fechar a torneira na hora de escovar os dentes, no ato de reutilizar água da máquina de lavar, por exemplo, fazem diferença. Em seguida, dentro da Educação, temos a educação ambiental. Há casos em que as pessoas têm educação, são bem instruídas, mas ainda não tem a consciência ambiental necessária. Eu tenho consciência ambiental desde criança, desde que eu me entendo por gente. Isso é graças a minha família. Meus tios, minha mãe, todos sempre tiveram essa consciência em relação aos bens ambientais, a natureza, muito ativa. Hoje eu trago comigo esta causa como um estandarte. Algumas pessoas argumentam “ah, eu faço isso mas não faz diferença”, “eu sozinha não vou fazer diferença”… tudo bem eu entendo que não vai fazer diferença, porque quando analisamos os dados, comparando a uma agroindústria ou uma indústria, os níveis de impacto são muito maiores. Porém, antes de a gente começar a cobrar as empresas a gente tem que fazer a nossa parte. Não adianta cobrar da empresa, da agroindústria, de prefeitura, de político, se nós não fazemos a nossa parte. A educação ambiental vem nesse novo mundo para começar a mostrar para gente que a produção precisa ser circular. Não adianta mais a gente pensar em produzir de forma extrativista e não se importar com o destino do resíduo. É isso que, por exemplo na minha página Muda Mundo, eu tento colocar uma sementinha na cabeça das pessoas. Claro que o alcance das minhas publicações não é tão grande, mas se uma pessoa se sentir tocada, já me dou por satisfeita. Porque o importante é eu dar o exemplo e tentar educar o outro, seja nas minhas postagens, seja eu como exemplo… disso surge a educação ambiental. Às vezes as pessoas querem ter um comportamento mais sustentável mas não sabem nem por onde começar. Dessa forma, por meio da minha página, ou pela convivência, eu sempre tento dar dicas ou dar exemplos e formar a consciência ambiental. A educação ambiental vem para fazer a gente refletir nas pequenas ações. Desde uma caneta que você utiliza até o combustível do seu automóvel. Eu hoje não consigo usar nada sem pensar em “de onde veio?”, “o que vai acontecer com isso?”… pensar no ciclo lixo. É muito preocupante o ato de ”jogar fora”. Você pega sua sacolinha de lixo, põem na lixeira, aí vem um caminhão, coleta, leva para o lixão… Mas… Como, se o planeta terra não tem fora? O planeta não tem fora! Nós precisamos repensar essa educação urgentemente!

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Realmente, “às vezes as pessoas querem ter um comportamento mais sustentável mas não sabem nem por onde começar”. Como adequar nosso modo de vida para diminuir o impacto ambiental do qual nós somos responsáveis? Por onde começar?

Por exemplo, a situação da água: ao invés de você ficar meia hora debaixo do chuveiro, se você tomar um banho de cinco minutos ligando e desligando o chuveiro para ensaboar, você vai economizar muito. E a sustentabilidade é tão interessante que ela é síncrona com outras questões. Quando a gente tem esse pensamento sustentável tudo fica sustentável. Neste exemplo, do banho, além da economia de água, economiza-se dinheiro também, já que você vai diminuir o consumo de água e de energia. O consumo de energia também é um fator que deve ser reavaliado. A trocar de lâmpadas, por exemplo, por equipamentos fabricados com led, ou fluorescentes, utilização de telhas transparentes, são opção de mudanças de comportamento. Existem muitas opções, o que falta é nós querermos fazer!

Que nossos hábitos são nocivos e que já destruímos muito do que tínhamos de recursos naturais, é fato. Mas se mudarmos de comportamento, se formos sustentáveis, existe volta? A natureza ainda pode se regenerar?

Infelizmente existem pessoas que querem desmerecer a causa ambiental, dizendo que é bobeira, que é manipulação. Você pode pensar isso, você tem direito de pensar o que você quiser. Mas o fato de haver regiões que antes eram ricas em água e hoje já não tem água, a questão da distribuição de chuvas, que eu havia falado, a radiação solar dentre outros exemplos, deixam claro o quão séria é essa questão. Com a necessidade da realização de Lockdown, e a queda vertiginosa da circulação de pessoas, a pandemia acabou por favorecer o meio ambiente.

Essa mudança deixou escancarado para todos os efeitos da ação do homem. Regiões como Veneza, que não se viam peixes há anos e até poucos dias a água estava cristalina. A natureza é tão perfeita que, um pouquinho que o homem sai de cena, ela consegue se regenerar. O buraco da camada de ozônio reduziu as emissões de dióxido de carbono na natureza reduziram durante os poucos meses que o ser humano diminuiu o ritmo das suas atividades e deixou de interferir tanto na natureza. A natureza tem uma grande capacidade de se regenerar. Eu vi algumas algumas charges que diziam assim: “Será que é a COVID-19 que está matando o ser humano ou é o ser humano que tá matando planeta?”. Será que não somos o vírus do planeta terra? Quando em equilíbrio, o planeta funciona muito bem. Sem o ser humano a natureza funciona muito bem, mas o ser humano não funciona sem a natureza.

De onde surgiu a ideia de criar a "Muda Mundo Educação Ambiental"?

O desejo de criar o perfil Muda Mundo casou com a ideia de três coisas que eu amo fazer que são: tema agronomia, tema ambiental e temas relacionados à educação. Criar o perfil foi uma forma de divulgar não só para o meu círculo de amizades mas aproveitar a internet e as redes sociais para e extrapolar as barreiras da intenção e atingir outros públicos com a educação ambiental. No perfil eu procuro dar dicas e recomendar pessoas que têm atitude sustentável. Eu por várias vezes me pegava pensando “cara, não tem jeito não tem jeito… o mundo não tem jeito..” porque você vê tanta coisa errada que começa a desanimar um pouco, eu confesso. Mas não é assim! Criado o perfil do Muda Mundo eu comecei a ver trabalhos sensacionais que reacenderam a chama de querer fazer algo. Pessoas criando, por exemplo, fralda de pano, cosméticos naturais, absorvente sustentáveis, shampoos sólidos, tecidos sustentáveis, artesanato, reaproveitamento de material, reciclagem de lixo, reaproveitamento de água… O perfil Muda Mundo Educação Ambiental foi criado justamente para isso: para conseguir atingir de uma forma educacional outros públicos além do meu alcance físico. É disso aí…

Espero que você tenha curtido essa super entrevista com a professora Juliana. Lembre-se: "Existem muitas opções, o que falta é nós querermos fazer" diferente. Então mão à obra!
Diego A. G.
Professor

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